Em 1997 a Bienal de Dança do Ceará realizava sua primeira edição. Passadas mais de duas décadas, constata-se que aquele evento não só foi um divisor de águas na história da dança cearense, mas também, ao longo dos anos, converteu-se em um dos mais importantes festivais de dança cênica da América do Sul. Rebatizada desde 2009 como Bienal Internacional de Dança do Ceará, em 2019 a mostra comemora vinte e dois anos de existência realizando sua 12ª edição.
A 12ª Bienal Internacional de Dança do Ceará é um evento que celebra alguns acontecimentos relevantes para a dança, tanto mundial quanto localmente: os 10 anos de morte de Pina Bausch, o centenário de Merce Cunningham, os 30 anos da Cia da Arte Andanças e os 20 anos do Colégio de Dança do Ceará. Pina Bausch e Merce Cunningham foram criadores que, de formas distintas e com assinaturas extremamente singulares, abriram novos possíveis para a criação coreográfica e imprimiram marcas profundas no panorama da dança cênica ocidental. A atuação da Cia da Arte Andanças, por sua vez, caminha lado a lado e implicada ao florescimento da dança contemporânea na cena local, uma presença que se afirmou de forma significativa nesse contexto pela força de suas criações e de seu ativismo cultural. O Colégio de Dança corporifica, a um só tempo, a gênese de duas grandes conquistas da dança local: de um lado, o início da mobilização da coletividade da dança em prol da implementação de políticas públicas para a área, de outro lado, na condição de primeira iniciativa pública de formação em dança realizada no âmbito estadual, o Colégio de Dança inaugura um novo campo de possibilidades, tornando-se referência e fonte de inspiração para muitos dos processos formativos em dança que viriam a ser implementados posteriormente.
Em parceria com o Porto Dragão, a Bienal realiza a quarta edição do Trajetos EnCena e produz um experimento cênico que sintetiza o espírito da edição de 2019: trata-se do espetáculo Inflamável. Em diálogo com o delicado, forte e virulento legado artístico de Leonilson, artista que décadas atrás já abordava em suas obras questões relativas aos devires minoritários, Inflamável celebra a força, a potência e a beleza da vida que vibra pulsante, que acolhe a alteridade e a multiplicidade e que se nega a sucumbir ante os afectos tristes. Num contexto em que o obscurantismo se manifesta sem pudor algum, a cultura é vitimada por ataques de instituições que deveriam justamente promovê-la e no qual a livre expressão e a diversidade cultural são cerceadas, Inflamável constitui-se como uma espécie de metáfora daquilo que a Bienal põe em movimento: o acolhimento, a celebração e a afirmação da diferença, dos devires minoritários e da potência da vida; a recusa a toda forma de truculência, obscurantismo, violência e retrocesso.
Apresentando uma extensa e diversificada seleção de artistas, a programação circula por cinco cidades distintas – Fortaleza, Itapipoca, Pacatuba, Paracuru, Trairi e Quixadá – e além de incluir um grande número de artistas locais, exibe ainda produções de São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e também de outros países, a exemplo de Colômbia, Portugal, França, Itália, Alemanha e Reino Unido. Entre artistas e companhias convidadas do Brasil figuram a São Paulo Companhia de Dança (SP), a Cia Etra (SP), o G2 Cia. de Dança Teatro Guaíra (PR), a Curitiba Cia de Dança (PR), Lia Rodrigues Companhia de Danças (RJ), Mônica Burity e William Freitas (RJ). A programação internacional inclui vários artistas que se apresentam pela primeira vez na Bienal, a exemplo da imPerfect Dancers Company (Itália), Filipe Lourenço (Portugal/França), Mauricio Flórez (Colômbia) e Tatambud Danza (Colômbia).
O elenco de convidados internacionais é complementado pela participação de experientes criadores à frente dos Percursos de Criação e da Plataforma de Acessibilidade da Bienal. Daphnis Kokkinos, integrante do renomado Tanztheater Wuppertal, no âmbito dos Percursos de Criação, conduziu uma residência artística inspirada na obra de Pina Bausch; a britânica Lindsey Butcher, diretora artística da companhia Gravity & Levity, participando do evento com o patrocínio do Programa Pontes, parceria da Oi Futuro com o Bristish Council, dirigiu um processo criativo no contexto da Plataforma de Acessibilidade, investigando a interface entre o circo e performance aérea.
A programação inclui ainda um rico panorama de produções locais, apresentando trabalhos de artistas experientes, coreógrafos emergentes, bem de pessoas e projetos contemplados em programas públicos de apoio à pesquisa, criação e formação. Cia da Arte Andanças, Cia Dita, Rosa Primo, Balé Baião, Paracuru Cia de Dança, Viana Júnior, Curso de Iniciação em Dança Contemporânea, Laboratório de Dança do Porto Iracema das Artes são alguns desses artistas e projetos.
Como em anos anteriores, a Bienal abriga mostras parceiras que, por meio de seus múltiplos olhares e curadorias, contribuem para enriquecer e ampliar a abrangência da programação. Dessa forma, nessa edição, apresentamos a MovimentarCE, mostra realizada em associação com o Porto Dragão e o Sesc Nacional; o Projeto Dança em Foco, em parceria com o Dança em Foco, e a Mostra TamoJuntxs, curada por artistas partícipes da história do Centro Cultural Bom Jardim.
Ante às adversidades e o desolamento que vivemos no presente contexto do país, a Bienal propõe-se a ser um espaço de contracultura do poder instaurado, de afirmação e sublevação, um chamado à rebelião pelo desejo, pela alegria e empatia; um lugar de acolhimento do outro, de celebração da liberdade e da vida. Façamos isso juntxs!